quarta-feira, 31 de março de 2010

Escândalos de abusos sexuais: responsabilizar Papa é injusto e lamentável


Cardeal de São Paulo, em entrevista ao Jornal O São Paulo, da Arquidiocese de São Paulo, pede que fiéis mantenham firme a confiança na Igreja

–Como os cristãos devem agir diante de tantas notícias de escândalos de abusos sexuais envolvendo membros da Igreja?

–Dom Odilo: Os cristãos são convidados a ter senso crítico e a manter sua serenidade e sua confiança na Igreja. É preciso separar o joio do trigo. A Igreja não nega, mas lamenta imensamente os males causados a outros e a ela própria por membros dela. A Igreja não ensina a cometer crimes, não os aprova e não os acoberta e deixa claro que cada um deve responder pelos seus atos perante Deus e a lei dos homens também. Mas as notícias sobre uma presumida responsabilidade pessoal do Papa no acobertamento de crimes de padres é forçada e instrumentalizada, em função de intenções não declaradas. E a aplicação dos crimes cometidos por alguns a toda a Igreja e a cada padre é injusta. Por outro lado, é preciso reconhecer que, quando se apontam “defeitos” na Igreja, ou nos seus membros, é porque se esperam dela e de cada um de seus membros comportamentos e atitudes que deixem claros e perceptíveis os altos valores e ideais que ela prega e nos quais ela crê. E isso também nos foi recomendado pelo próprio Jesus: “brilhe a vossa luz diante dos homens, para que eles, vendo vossas boas obras, glorifiquem o Pai que está nos céus” (Mt, 5,16). Isso é missão e tarefa de todos nós.

–Bento XVI, já na época em que era prefeito da Congregação para Doutrina da Fé, fez muito contra a pedofilia. A que o senhor atribui essas tentativas de passar a imagem de que a Igreja é conivente com tais delitos, quando, na verdade, é muito severa nestes casos?

–Dom Odilo: Primeiramente, é próprio da realidade da nossa Igreja que o bem de um membro seja o bem de todo o corpo; e o mal de um membro seja sentido por todo o corpo... Pena que se prefere lançar todos os faróis sobre os males e fraquezas existentes na Igreja, passando a impressão de que toda a Igreja está mergulhada num mar de lama. Toda pessoa bem intencionada sabe que não é assim. É preciso distinguir, e não lançar indevidamente os comportamentos reprováveis de alguns membros da Igreja a toda a Igreja. Tenho a impressão, infelizmente, que também existe uma ação orquestrada para, de modo forçado, responsabilizar pessoalmente o Papa por todos esses males. É injusto, lamentável e causa muita dor. De fato, em primeiro plano não aparece a defesa das vítimas dos crimes, mas os ataques ao próprio Papa e à Igreja. A quem isso interessa? Rezemos pelo Papa e mantenhamos firme a nossa confiança na Igreja. Ela precisa, em cada um de seus membros, de constante conversão e busca da santidade; mas, tenhamos a certeza disso: Jesus prometeu estar sempre com ela.

–Em relação à reportagem da revista “Istoé” da semana passada, afirmando que a Santa Sé está treinando exorcistas por atribuir os escândalos sexuais à possessão demoníaca... Existe esta orientação?

–Dom Odilo: A reportagem citada é sensacionalista. Embora a Igreja nunca tenha deixado de ensinar que o demônio existe e é um ser pessoal, e não uma “energia negativa”, e tenha sempre mantido o rito de exorcismos, não tenho nenhum conhecimento de alguma recomendação especial do Papa para que, agora, se intensifiquem exorcismos na Igreja, nem que os exorcismos resolveriam o problema dos escândalos sexuais de alguns membros do clero... Isso é ridículo. O que resolve mesmo é a conversão da vida e levar novamente a sério os mandamentos da Lei de Deus, os preceitos morais decorrentes do Evangelho de Cristo e da lei natural. E isso é muito mais urgente que treinar exorcistas. Por falar nisso, já reparou que, antes do Natal e da Páscoa, costumam aparecer reportagens “de fundo” sobre religião e cristianismo? Geralmente são de cunho bastante sensacionalista e servem apenas para desviar as atenções do conteúdo central da nossa fé e da pregação da Igreja. Não devemos deixar-nos levar por essa “marquetização” da religião e da nossa fé. Nossa tarefa é promover com coragem e intensidade o anúncio da verdade e a formação das consciências à luz da verdade da Palavra de Deus e na retidão da lei moral.

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